Por que tenho medo de ser auditado
Tenho me questionado muito sobre
porque as pessoas não gostam de auditoria. Embora eu acredite que ninguém
goste de ser fiscalizado, não consigo entender como as pessoas criam
estereótipos tão fortes que se perpetuam pelos tempos.
Por mais que tentemos nos mostrar como "consultores" ou
que realizemos um trabalho para auxiliar a administração no desenvolvimento
de suas atribuições, sempre somos vistos com rejeição.
Se observarmos bem, vamos ver que nós auditores internos
também alimentamos nosso ego com o medo que as pessoas têm do nosso
trabalho. Medo e poder andam lado a lado; se temos medo de alguém é porque
ele exerce um certo poder sobre nós. Assim, muitos auditores preferem criar
o terror para que seu poder seja exercido.
Muitas das vezes o auditor não percebe que está criando
esse clima de medo e, talvez em função da carga de trabalho que tem, não lhe
sobre tempo para trabalhar suas relações com as pessoas.
Se analisarmos o trabalho do auditor interno, vamos
verificar que sua missão é informar aos superiores do auditado as falhas
encontradas. Quem gosta de ter seus erros expostos aos seus superiores? É ai
que está o grande dilema que o auditor tem que enfrentar para superar o medo
que as pessoas tem da auditoria.
Suas descobertas durante a auditoria normalmente chegam ao
topo da empresa e existe uma boa chance de que alguém tenha que dar
explicações aos superiores, em razão das deficiências apontadas pelo
auditor.
Vamos imaginar que você foi contratado para executar uma
tarefa, mas existe uma pessoa que tem a função de avaliar sua atuação e
confeccionar um relatório para seu chefe sobre a sua atuação. O que você
pensaria sobre aquela pessoa? Provavelmente, a palavra mais adequada que
você acharia para classificá-lo seria a de dedo-duro.
Com o auditor interno ocorre o mesmo. A cada auditoria ele
tem que enfrentar um conjunto de regras novas, fazer perguntas e obter
cooperação para conseguir realizar o seu trabalho. Ele nunca conseguirá
realizar um bom trabalho se não conseguir a cooperação das pessoas.
Alguns auditores têm a noção clara de como as pessoas são
importantes para a realização do seu trabalho; outros podem sair dando
pontapés e assustá-las. Mesmo conseguindo superar essa postura, alguns
auditores não sabem como lidar com pessoas. Existem auditores internos muito
bem intencionados, mas poucos são os que conhecem a arte de conquistar
pessoas que possam ajudá-los em seu trabalho.
Existe um provérbio índio que diz: "Não julgues um homem
até que tenhas calçado por um dia seus mocassins".
Isso significa que você deveria tentar pôr-se no lugar do
outro para que possa realmente entendê-lo ou tenha o direito de criticá-lo.
Se o auditor não atuar dessa maneira cometerá dois erros
fatais: primeiro, ele fará com que as pessoas questionem seus
posicionamentos com o argumento de que ele nunca passou por isso para
compreender porque as pessoas erraram. Segundo, ele não conseguirá que os
erros detectados sejam corrigidos.
A palavra mais correta para definirmos a postura das
pessoas é DEFESA. Todos estarão na defesa com o auditor, ou seja, tentando
se proteger. Neste caso, proteção contra o auditor.
O auditor nesse momento representa uma ameaça. Eles o vêem
como alguém que descobrirá seus erros, podendo até expô-los ao ridículo,
relatando aos seus superiores. Elas ficam ansiosas para conferir, ao término
do trabalho de auditoria, se alguma tarefa sob sua responsabilidade consta
do relatório.
É só lembrarmos de quando éramos crianças e aprontávamos
alguma bagunça e nossa mãe ameaçava-nos com a seguinte frase: "Vou contar
para o seu Pai". Essa é mais ou menos a visão que o auditado tem do auditor.
Ele está em constante ameaça: "Vou contar para o seu superior".
Outro problema é a postura do auditor frente aos achados
de auditoria. Alguns auditores quando encontram ou ouvem sobre alguma coisa
que está sendo executada de modo errado, o fazem de forma a tornar público e
expor os envolvidos ao ridículo. É preciso que eles entendam que estão
tratando com pessoas e, desde de que elas não façam as coisas de má-fé, é
importante orientá-las e não ridicularizá-las por suas falhas.
Outro erro é a questão da relevância. Muitas vezes
detectamos pequenos erros e fazemos grande alarde sobre eles. Também erramos
quando tentamos mostrar para as pessoas que somos mais inteligentes do que
elas, usando nosso conhecimento para que se sintam estúpidas.
Os auditores internos devem levar em conta os problemas
que as pessoas enfrentam no seu trabalho, pois se não o fizerem as pessoas
não darão crédito ao seu trabalho.
Algumas regras são fundamentais para tentar minimizar ao
máximo o efeito do medo nos trabalhos de auditoria.
Primeiro, antes de entrar no local onde realizará a
auditoria, ligue para o responsável. Através de uma conversa amigável,
procure informar sobre sua chegada e assegure que procurará interferir o
mínimo possível na rotina diária dele. Procure deixá-lo à vontade, pois se
você de saída deixá-lo apreensivo, todas as outras pessoas que trabalham com
ele também ficarão. Mas lembre-se, você já comprometeu sua postura diante do
responsável pelo setor/órgão auditado. A primeira impressão é a que fica.
Segundo, no seu primeiro dia no local da auditoria,
procure ser agradável com todos, desde o administrador até o funcionário
menos graduado. Passe a seguinte mensagem: "Eu sou um convidado na casa de
vocês." Essa tem que ser a sua atitude durante toda a auditoria. O primeiro
contato pode ser derradeiro para o sucesso de seu trabalho.
Terceiro, sempre que se dirigir às pessoas com perguntas
ou pedidos de explicações seja amigável e respeitoso, seja ele o
administrador ou o menos graduado. A confiança não se conquista
imediatamente, ela vai sendo construída durante o trabalho.
Quarto, existem maneiras de agir frente aos erros
encontrados. Ache alguma coisa errada e vá diretamente ao gerente sem falar
com a pessoa que cometeu o erro e você estará jogando todo o seu trabalho na
lata do lixo.
Procure passar para as pessoas envolvidas que você está
analisando todo o sistema e não apenas erros individuais. Os erros só são
importantes se eles estiverem inseridos no contexto total do sistema. O que
você precisa é que o auditado lhe explique como funciona o sistema, o que
atrapalha o seu trabalho, etc. Esteja certo de que com essa abordagem as
pessoas vão ajudá-lo no desenvolvimento de seus trabalhos. Essas pessoas
junto com você estarão jogando no mesmo time.
Dessa forma você estará se mantendo longe de assuntos
técnicos, interrogativos, pelo menos no início. Você se concentrará nos
sistemas de administração, onde somos peritos.
O auditor tem dois objetivos a serem atingidos:
■ Primeiro, relatar à administração superior todos os seus
achados.
■ Segundo: deixar todo o lugar que ele audita, melhor do
que encontrou.
Para que conquistemos a confiança das pessoas, temos que
informar-lhes que discutiremos com elas, imediatamente, todos os problemas
encontrados. Que ela terá a oportunidade de regularizar qualquer falha antes
da emissão do relatório final; ou que as falhas que não possam ser
regularizadas no transcurso dos trabalhos serão informadas à administração
superior como em fase de regularização. Com isto você estará criando uma
parceria e não um jogo de polícia e ladrão. Não fale apenas das coisas
erradas que você encontrou, fale também das coisas boas, pois é impossível
que não existam virtudes nos ambientes que você está auditando.
Outro erro que o auditor comete é achar que as pessoas só
gostam de ouvir coisas boas. Pode parecer estranho, mas eu explico. Isto
ocorre quando você termina um trabalho de auditoria e não encontra nada, ou
apresenta falhas irrelevantes, quando todos sabem que existem falhas
interferindo em seu trabalho e que não foram detectadas pelo auditor. É a
mesma coisa que você receber um prêmio ou elogio por uma tarefa ridícula que
você cumpriu com extrema facilidade.
O respeito pelo trabalho de auditoria é conquistado quando
o auditor: informa as pessoas envolvidas antes de informar aos superiores;
define corretamente a responsabilidade das pessoas sobre os fato
constatados, não responsabilizando as pessoas indevidamente; decide porque
possui todos os fatos e dados que suportam suas afirmativas; não se
concentra em falhas irrelevantes; e tem uma visão abrangente dos sistemas e
controles de modo a melhorar o desempenho da unidade e não somente corrigir
erros individuais.
As pessoas podem conseguir gostar do auditor interno, se
ele realmente trabalhar para isto. Isso porque nós reconhecemos que as
pessoas têm medo e não querem ser ridicularizadas, que elas nos admiram pela
nossa capacidade de aprender com elas; que as pessoas podem agradecer-nos
porque conseguimos mostrar maneiras mais fáceis e melhores de fazer as
coisas ou porque conseguimos resolver ou ajudá-las a resolver problemas que
as têm aborrecido.
Outra coisa que causa medo nas pessoas é a forma como os
auditores lhes colocam seus questionamentos.
Quando você faz perguntas complicadas, ou não deixa as
pessoas falarem, ou começa a fazer julgamentos mentais ou expressos,
fatalmente você não vai conseguir colaboração.
Quando o auditor se mostra interessado, simpático e
compreensivo, encontrará disposição nos seus interlocutores para o diálogo.
Parece engraçado, mas quando as pessoas conseguem falar com um auditor
paciente, interessado e simpático, o problema será conseguir fazer com que
elas parem de falar.
Evite argumentos do tipo "ganha-perde". Não diga "deve ser
feito deste modo ou então..." Use palavras como "O modo como eu vejo
isto...". Essas pequenas frases podem fazer grande diferença para evitar
conflitos.
Você tem que mostrar para todos os que o ouvem que você
também está disposto a escutá-los. Mas mostre isso também com o corpo, pois
ele fala e as pessoas o entendem. Entenda como uma pessoa se sente quando
você a está criticando. Amenize o clima., pois certos comportamentos,
palavras ou gestos podem criar um clima de defesa e isso não será bom para o
seu trabalho.
Um clima de neutralidade também prejudica, pois a pessoa
neutra se mantém fria, distante e demonstrando pouca preocupação com o
ouvinte. Por outro lado, um clima encorajador faz com que o interlocutor
escute e se comprometa com a resolução dos problemas.
Nós já falamos, mas outro fator é a postura de
superioridade que alguns auditores passam para as pessoas.
Perceba que elas já estão em posição de inferioridade em
relação a você, pelos diversos aspectos que já comentamos. A igualdade é
encorajadora, pois demonstra confiança mútua. A diferença de "status" entre
você e outra pessoa - se é que podemos dizer que existe - tem que parecer
sem importância.
Também existe a postura de controle, autoritária, que
tenta influenciar alguém ou pedir-lhe abertamente que ele faça aquilo que
você esta mandando. Pelo lado encorajador você constrói a solução junto com
a pessoa, ambos são responsáveis. Significa que as perguntas e respostas
estão sendo construídas em conjunto, formando uma parceria para resolver
problemas.
Você também não deve se sentir em inferioridade quando as
pessoas apresentam alternativas de solução diferentes das suas. Entenda que
você pode não ter analisado todas as possíveis soluções. Você não é
infalível, reconheça seus erros e - mais importante - reconheça idéias
melhores que as suas.
As pessoas só conseguirão gostar dos auditores internos
quando elas entenderem que fazem parte de um sistema de controle interno,
dentro do qual elas também contribuem para o atingimento de resultados
positivos ou negativos. Elas participam dos resultados do trabalho de
auditoria.
Baseado no livro Modern Internal Auditing: What's it all about? The
Grandfather's Dialogue, de Lawrence B. Sawyer - Adaptação feita por: Antonio
Carlos Correia - Revisão: Rudinei dos Santos.o.
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